por Mário Medina
A opinião
predominante nas correntes da esquerda é de que a participação /
intervenção no processo eleitoral burguês foi vitoriosa. Curioso
notar que os maoistas, por exemplo, superestimam os já habituais
30% de nulos, brancos e abstencções, pintando um cenário de extremo
descontentamento das massas trabalhadoras, o que é certo, mas
apontando o voto nulo como expressão de uma maior tomada de
consciência dos trabalhadores, argumento largamente usado para
ratificar seu posicionamento pró- voto nulo. Ou seja, o argumento
tacanho vem em defesa de uma política que até respeitamos como
expressão legítima de uma corrente de pensamento que tem suas
convicções, mas que não nos furtamos de apontar como sendo
equivocada.
Ora, se o povo
estivesse assim tão consciente do caráter de classe, teria ido às
urnas pra votar no Psol, no PSTU, no PCB; elegeria uma robusta
bancada da esquerda radical, levaria ao segundo turno nossos
candidatos aos cargos majoritários, etc. Aliás, se o povo estivesse
assim tão consciente, estaríamos às portas da revolução brasileira.
Mas, pelo contrário, vivemos uma conjuntura de consciência atrasada.
Vejam que a bancada evangélica cresceu, a bancada ruralista cresceu,
as bancadas da bala estão em plena ascenso, a bancada do PT, a mais
progressista dentre as maiores bancadas, diminuiu.
Desde sempre o
marxismo leninismo revolucionário defendeu a intervencao dos
comunistas revolucionários nas instâncias da democracia burguesa.
Nao como estratégia de tomada do poder por via
democrática-eleitoral, mas como uma tribuna a ser usada para
disseminar ideias e apontar as contradicções do regime.
Os companheiros
maoistas, por exemplo, tomaram a liberdade de revisionar esse
pressuposto leninista de intervenção. Eles tem todo o direito de
fazer o que bem entendem, mas nós temos o direito de fazer a crítica
e alertar a classe trabalhadora dos motivos pelos quais participamos
no processo eleitoral, muito embora sempre pontuemos suas limitações
e apontemos para alternativas revolucionárias no processo de tomada
do poder.
A esquerda centrista
e revisionista que participa das eleicoes com seus partidos e
candidatos, por outro lado, pinta um cenário de vitória moral, por
assim dizer, ressaltando a heroica intervencao de uma esquerda que
faz campanha sem ter dinheiro ou aparatos, que não se vende aos
financiamentos capitalistas, etc, o que é verdade; mas nao tem a
grandeza moral de tecer auto-críticas e assumir derrotas.
Esse discurso da
vitória é velho conhecido dos militantes sociais. Toda vez que
alguma coisa nao dá muito certo, sempre aparece uma meia dúzia de
dirigentes dizendo à sua base coisas como: `` Foi uma vitória,
companheiros. Saimos dessa luta sabendo que fizemos o que estava ao
nosso alcance. A mobilizacao já é uma vitória, etc, etc``.
Não estamos dizendo
que a mobilizacao nao é uma vitória. Evidente que se mobilizar é
muito bom. E com tanta repressão do estado, com tantas dificuldades
que surgem em meio a processos de luta, etc. Mas tem muita gente
fazendo tábula rasa das lutas sociais com esse discurso. E isso é
desonestidade intelectual. Amenizar a complexidade dos processos
históricos de luta para reduzí-los a um discurso pasteurizado é
subestimar a base social a que se fala, é se blindar de crítica, é
se furtar de uma discussão extremamente necessária para um salto
qualitativo da organização dos trabalhadores.
A RPR sauda os
valorosos militantes da esquerda revolucionária, mas não a troco da
ocultacao de questões que nos soam mais pertinentes do que nunca.
Fizemos o que podíamos ter feito para colocar nossas candidaturas na
rua? Certamente. Fizemos o diálogo com as massas, apresentamos uma
plataforma política de transição ao socialismo? Certamente. Mas isso
não é tudo. Não é só de eleicao que vivem os partidos de esquerda.
E é nisso que nos distinguimos dos velhos partidos da ordem. Nossos
partidos não são meras legendas pra nos dar o direito de lançar
candidatos e eleger parlamentares. Nossos partidos são instrumentos
de organizacção das lutas.
E se não tivéssemos
o registro no TSE, se ainda estivéssemos na clandestinidade? Nossas
organizações não podem ser legendas para coadunar com o cretinismo
parlamentar, mas tem que ser espaço dos trabalhadores, dos
estudantes, da juventude das periferias. Tem que ser espaço dos
sindicalistas, das lutas salariais, das lutas por direitos; lugar de
articular greves e manifestações, lugar de conspirar contra o poder
do capital. Em suma, as organizacoes revolucionárias só tem razão
de existir se estiverem comprometidas com a revolução social.
O Psol rachou no
segundo turno e nao foi capaz de apontar uma alternativa para sua
base social. A esquerda rachou, com ligeira vantagem numérica da
opcão pelo voto nulo sobre a opcão pelo voto crítico em Dilma. A
questao aqui é delicada. A base ficou dividida entre as deliberacoes
de voto nulo da maioria das direcções e o medo da volta dos tucanos.
Mas uma hora o PT vai sair do poder. Tudo o que discutimos agora será
retomado em breve, até porque Dilma corre o risco de não chegar ao
fim do mandato, e vamos nos deparar outras vezes entre o ruim e o
menos pior, entre os ataques desferidos pela frente popular do PT e a
iminente volta da direita tradicional.
Mas esse não é
ponto central. Tudo isso é circunstancial e as divergências táticas
fazem parte da diversidade política que existe na esquerda
brasileira. O ponto central é saber como lidar com a necessidade de
construir uma alternativa revolucionária no país, independentemente
da conjuntura política que estará posta. Essa alternativa passa pela
unidade da esquerda. Existe um sem número de partidos e correntes,
mas também existe mais de uma dezena de centrais sindicais, existe
uma gama imensa de movimentos sociais, e existe uma desarticulação
que impede o avanço geral da classe e dos oprimidos.
O levante de Junho
de 2013 foi um sopro de esperanca, mas não avançou por falta de uma
direção. A esquerda, mais organizada, talvez fosse capaz de liderar
uma sublevação popular contundente, com greves gerais, ganhos
efetivos.
Muitas propostas
foram colocadas, e devem ser ponderadas com seriedade e maturidade.
Mas um fórum unificado das Jornadas de Junho nos parece
imprescindível, pra nao perder o folego das revoltas populares, pra
continuar nas ruas e preparar a classe e sua vanguarda para as lutas
do próximo período. As oportunidades históricas não podem nos
escapar por entre os dedos. Está na hora de superar egos e
sectarismos!
Nenhum comentário:
Postar um comentário